São Bento da porta aberta

Por estes dias, e em especial no de hoje, 25 de Abril, mundanidades várias provocam em Portugal uma espécie de histeria colectiva em que toda a gente — na acepção de “as massas”, entenda-se — manifesta a mesma sintomatologia: fúria paranóica, discurso confuso e incoerente, hiperactividade e ainda, mais prosaicamente, pulsação acelerada, sudação excessiva e disfagia (dificuldade em engolir). O surto epidémico, felizmente, não será expectável que vá prolongar-se para além de 24 horas, ou, não havendo grande azar, nem isso.

A coisa costuma passar sem grande novidade, como aliás sucede com qualquer outro ritual periódico, mas este 49.º aniversário do 25 de Abril teve a particularidade de introduzir — na sequência de mais uma ideia peregrina cuja autoria é, como de costume, incerta — um elemento estranho nas comemorações: alguém ter-se-á lembrado, talvez por inspiração divina ou, quem sabe, por influência do Mafarrico, de transformar um Chefe de Estado estrangeiro no patrono (ou patrão?) das cerimónias oficiais que decorreriam em pleno palácio de São Bento.

Ora, talvez porque São Bento não é exactamente a mesma coisa que o São Bentinho da Porta Aberta (ou se calhar até é), de imediato formaram-se dois bandos, os a favor e os contra, armando-se ambos com as respectivas mocas partidárias e seus cacetes ideológicos. Seguiram-se os típicos confrontos estilizados, aliás típicos dos chamados primatas superiores, e também à semelhança do que acontece nos embates do género entre bandos de outros ramos, como os chimpanzés ou os gorilas, parece que todos se limitaram a seguir o seu instinto, ou seja, não houve bordoada, aquilo foi tudo à base de ameaças, uns quantos urros e punhadas no peito, nada de especial.

Não se chegou, felizmente, a vias de facto, mas, já quanto a pontapés na gramática e, muito mais grave ainda, a desprezo pela História de Portugal, houve para todos os “gostos” e em série. Culminando nesta espantosa pérola de “cultura”.

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E ainda esta outra, em que o mestre-de-cerimónias do dia (de ontem) — aliás imitando o seu compagnon de route e um outro fulano qualquer — lamenta que em Portugal se fale… Português. Bem, já sabemos, utilizando o truque do costume (a língua brasileira passa a designar-se como “variante”), mas sem sequer tentar disfarçar a sua aspiração a que a “língua universau” (brasileira, claro) ande depressinha e liquide de uma vez por todas a Língua Portuguesa. Por isso mesmo exprime o dito “mestre” o desejo de que por cá se use o sotaque da elite, isto é, o “fálá cuutu” do Brasil. Ora, como a cacografia dessa “língua universau” consiste numa espécie de transcrição fonética do dito “fálá”, então o objectivo é a “adoção” não apenas do “sutáki” mas também — ou principalmente — do código cacográfico brasileiro.

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A questão não reside propriamente em apurar ou sequer concluir seja o que for. Está tudo aí, obscenamente escarrapachado, para quem quiser ver.

Bem, pois claro, vai depender do estômago de cada qual. Será talvez prudente consumir esta série de aberrações com alguma parcimónia, quiçá em doses homeopáticas. Como muito sabiamente prescreviam os Antigos, quando algo é repetido ad nauseam, o risco de isso provocar o vomitus é elevado, portanto devem ser ingeridas boas quantidades de lime (limão) e de panem (pão), muito, imenso panem.

Porque andamos há milénios a panem et circenses mas deste estamos todos mais do que fartos.

[Imagem da igreja de São Bento da Porta Aberta de: siteSerra do Gerês“]


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