SPA – Dia do Autor português em Português



A Sociedade Portuguesa de autores não assume posição pública sobre a questão do Acordo Ortográfico porque entre os seus mais de 26 000 associados há autores que lhe são favoráveis e autores que liminarmente o renegam por o considerarem errado e totalmente desligado da realidade linguística lusófona. No entanto, a SPA considera que este assunto foi erradamente conduzido pelos vários Estados lusófonos, com destaque para o português que não efectuou qualquer consulta às entidades que legitimamente se poderiam ter pronunciado sobre o assunto, designadamente a própria SPA, o Pen Clube e a Associação Portuguesa de Escritores, entre outros. Só por este motivo a SPA sempre se considerou excluída deste debate e de qualquer escrutínio que envolvesse o assunto. Apesar disso, a SPA promoveu em Janeiro de 2013, um acto de consulta aos seus associados, que representam todas as disciplinas criativas que a instituição abarca e obteve o seguinte expressivo resultado: 145 autores manifestaram-se contra o Acordo Ortográfico e 23 a favor. Legitimado por esta votação, o Conselho de Administração da SPA decidiu que o Acordo Ortográfico nunca seria respeitado na regular produção de textos da instituição, que continuou a reger-se pela norma antiga, sem qualquer abertura às novas regras que poderiam decorrer da vigência do Acordo Ortográfico. Agindo desta forma, a SPA respeita e honra a vontade da significativa maioria dos que se pronunciaram. Entretanto a evolução deste assunto na comunidade lusófona veio demonstrar que não existe margem para outra forma de procedimento e que foram os próprios países que têm português como língua oficial que se encarregam de neutralizar o Acordo Ortográfico e de o excluir da nossa realidade linguística e comunicacional, não obstante as formas de obrigatoriedade geradas pelo sector editorial, sobretudo em relação ao livro escolar e infanto-juvenil, que deverão ser respeitadas sempre que os autores as aceitem.

Nos restantes casos, o Acordo Ortográfico é respeitado e levado à prática sempre que a vontade dos autores se manifeste nesse sentido, enquanto se aguarda que o assunto seja definitivamente encerrado ao nível das relações entre Estados, envolvendo necessariamente países como Angola e Brasil, para além de Portugal, devido à sua dimensão demográfica e à sua expressão cultural internacional. Só se deve pôr de acordo aquilo que justifica e legitima esse acordo. A SPA continua, nos seus documentos, a não se reger por um acordo que mostrou ser insustentável.

José Jorge Letria
(Presidente da Direcção)

Artigo publicado na 1º edição da “Sem Equívocos”.

5 de “maio” de 2023 [vídeo]

«O dia foi criado em 2005 durante uma reunião em Luanda, Angola, dos ministros da cultura de sete países lusófonos». [“Wikipédjia lusôfuna“]

Este “videoclip” surge por uma série de acasos, a começar pelo simpaticíssimo convite de uma “vizinha” do Facebook e a terminar no facto de ter tido de eliminar as referências iniciais ao dito convite, porque afinal — como aliás seria mais do que expectável — as minhas “considerações” sobre esta data são tudo menos elogiosas ou laudatórias; muito pelo contrário, está bem de ver, até por uma questão de coerência: aquilo que digo no vídeo não é mais do que uma tentativa de condensação do que sempre disse por escrito aqui no Apartado (desde 2015), no “site” da ILCAO (de 2010 a 2015), no Apdeites (2008/2009) e um pouco por todo o lado (como em desacordo.wikidot.com) antes disso.

Para quem tiver a paciência suficiente para ouvir, o que a suceder será merecedor dos mais rasgados elogios, dada a minha proverbial aversão a este tipo de registo (e respectiva, desgraçada falta de jeito), irá com certeza reconhecer algumas das menções mais vezes aqui reiteradas em texto, não apenas ao 5 de “maio” como à sucessão de acontecimentos que desde 1986 têm forçado a Língua Portuguesa a aproximar-se perigosamente do linguicídio.

Uma pequena amostra dos posts referidos no “depoimento”:

[5 de Maio: dia mundial da língua brasileira] – (…) mais uma manobra de contra-informação e de intoxicação da opinião pública sobre a inacreditável farsa com que hoje em dia se designa a língua brasileira veiculada pelo “acordo”, rebaptizado como “Língua Portuguesa” — uma palhaçada nojenta.

[5 de “maio”, dia da língua de vaca (e da cultura do feijão)] – O “Dia da Língua Portuguesa (e da Cultura Lusófona)” é uma patranha inventada em 14 de Maio de 2005 pelos acordistas de serviço, portugueses e brasileiros (com a presença folclórica de representantes dos PALOP), no intuito de revestir de uma aparência “tradicional” e “histórica” a colossal manobra de genocídio linguístico (e cultural) a que alguns mafiosos chamam “acordo ortográfico”.

[Lápis azul nas redes anti-sociais] – Trata-se, portanto e em suma, de deixar a quaisquer presentes ou futuras vítimas de censura ou represália por delito de opinião algumas pistas, caso ainda acreditem que também existe disso em Portugal, para que exerçam a sua prerrogativa mais básica e inalienável — o direito de legítima defesa.

[“Não falo o português.” Ah, pois não, não.] – (…) a Língua Portuguesa e o brasileiro são tão diferentes entre si como o Português e o Galego, por exemplo, mesmo dando de barato que a Língua Galega, ao contrário da brasileira, mantém intactas as estruturas gramaticais — nomeadamente a sintaxe — comuns a ambas as Línguas.

[A Wikipédjia lusôfuna] – Então, afinal, como sucedeu a endlösung da Wikipedia em Português-padrão? Bem, a “solução final” foi decidida por um enorme universo de… 22 pessoas. Na imagem aqui ao lado estão os resultados de uma “votação” que determinou a extinção sumária do Português de Portugal na “Wikipédia Lusófona” (…)

[Lusofobia: causa(s) e efeito(s)] – (…) aquilo em que de facto consiste a lusofobia enquanto fenómeno sociológico, por assim dizer, já que a maioria das pessoas não apenas desconhece o conceito como nem mesmo alguma vez ouviu sequer falar de tal coisa. No fim de contas, o próprio termo presta-se a confusões visto que difere numa única letra de “lusofonia”; evidentemente, apesar da semelhança “sonora”, o significado do substantivo “lusofobia” — que remete para uma atitude concreta — não tem absolutamente nada a ver com a ideia abstracta e indefinida de “lusofonia”, uma palavra vazia de significado que serve apenas finalidades e objectivos políticos.

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Wokultura

EnidBlyton e alterações ‘woke’: ignorância e ilegalidade

Patricia Akester

“Diário de Notícias”, 07 Abril 2023

Como leitora voraz que sempre fui, os livros de EnidBlyton não me passaram ao lado. Devorei os mistérios e aventuras dos Cinco e com eles percorri a sua ilha favorita, andei no colégio de Santa Clara, em Londres, com as gémeas O’Sullivan, frequentei o colégio das Quatro Torres, na Cornualha, acompanhei um clube de pequenos detectives, os Sete, detendo senhas para as suas reuniões secretas, trepei intrepidamente a Árvore Longínqua e ajudei diligentemente a resolver vários mistérios que tendiam a despontar em Peterswood, no condado de Buckinghamshire.

Infelizmente o lobby anti-Blyton não partilha do meu entusiasmo e tem atacado ferozmente a sua obra, apelidando-a de snob, misógina e racista. No seio deste movimento os livros de Blyton foram banidos de numerosas bibliotecas e novas edições têm emergido, uma vez revistas e reeditadas, com nomes, personagens e enredos adulterados com vista a — pasme-se — convertê-las em obras politicamente correctas, isto é, cumpridoras de imperativos «woke». A título de exemplo, a revisão das obras tem abarcado a eliminação de nomes considerados ofensivos, o respeito pela neutralidade de género, a divisão de tarefas domésticas, o cumprimento dos horários escolares e a resolução de mistérios e acção e aventura sob supervisão de um adulto.

Esquecem que os maravilhosos livros de Blyton encerravam aventura, mistério e magia, fornecendo simultaneamente (pormenor que tende a ser afastado) lições, ensinamentos e pedagogia. Os personagens eram recompensados por actos de generosidade, bondade, honestidade, humildade e outras virtudes e punidos quando mentiam, roubavam, tinham acessos de raiva, eram mal-educados, gananciosos, egoístas ou cruéis.

Ignoram que sob um estilo de escrita despretensioso Blyton gerou enredos repletos de complexidade, explorando, por exemplo, as questões de raiz que levavam os adolescentes a incorrer em comportamentos socialmente inaceitáveis. Olvidam que as referências a poder monetário eram raras e que o sucesso dos protagonistas de Blyton advinha da sua habilidade intelectual, da sua capacidade de trabalho, do seu bom carácter e de uma pitada de magia. Desconsideram que Blyton criou personagens femininas cheias de garra, como DarrellRivers ou as gémeas O’Sullivan e que as suas personagens mais célebres e memoráveis são raparigas (e não rapazes) obstinadas, ousadas e rebeldes.

Talvez o politicamente correcto deva adquirir perspectiva. A obra de EnidBlyton é um produto de seu tempo e do seu espaço e há que a reconhecer como tal. O mesmo sucede, por exemplo, com os livros de Joseph Conrad, de AldousHuxley e de Agatha Christie. Se as personagens de Blyton são demasiadamente abastadas que destino devem ter os mordomos e as empregadas que surgem aos pontapés na obra de Agatha Christie? Se as histórias de Blyton têm laivos de racismo como devemos encarar a obra de Shakespeare, designadamente a referência ao mouro que habita Otelo e ao judeu que tem lugar proeminente no Mercador de Veneza?

As alterações em causa retiram à obra a verdade da época e do espaço em que foi escrita, vedando a constatação e a avaliação da evolução histórica, sociológica e literária. O panorama literário é assim empobrecido, podendo o leitor chegar a um ponto em que apenas tem acesso a literatura contemporânea (politicamente correcta, claro está), sendo as restantes obras literárias banidas e/ou censuradas em nome (reparem no paradoxo) de valores liberais — e convertendo-se os livros de outrora em artigos de colecção.

Impõe-se ainda referir que as revisões acima referidas não são lícitas, em muitos países, graças a algo que o Direito de Autor qualifica como os direitos morais do autor. Tais direitos decorrem do reconhecimento da natureza eminentemente pessoal da criação do espírito e do vínculo, imperecível, entre criador e obra.

O nascimento dos direitos morais remonta ao século XIX, salientando-se, em 1814, o facto de um Tribunal francês ter reconhecido que certo autor tinha direito a que o seu manuscrito não fosse alterado, sem a sua autorização, pela editora à qual havia sido submetido (Billecocq v. Glendaz, Tri. civ. Seine, 17/08/1814). Em 1928, os direitos morais foram incorporados na grande Convenção de Berna para a Protecção das Obras Literárias e Artísticas, com reflexos na lei portuguesa que declara, sem hesitação, que o autor goza do direito de assegurar a genuinidade e integridade da sua obradireito esse inalienável, irrenunciável e imprescritível, cuja guarda passa, após a sua morte, para os seus sucessores.

Consequentemente, embora o estudo da obra de Blyton, incluindo no que toca a preconceitos e estereótipos seja bem-vindo sob uma perspectiva académica, alterar a obra traduz-se em mutilação e deformação da mesma, desvirtuando-a e podendo afectar a honra e reputação do seu autor e consistindo, pois, em acto ilícito em muitos pontos do globo.

Em suma, retirar a obra do contexto em que foi redigida e actualizá-la de acordo com uma das linhas vigentes de pensamento é mais uma tentativa de mudar a História, sendo pelos motivos acima apontados fruto de ignorância e de esquecimento e empobrecendo deste modo o quadro cultural mundial.

PatriciaAkester

Fundadora de GPI/IPO, Gabinete de Jurisconsultoria e
Associate de CIPIL, Universityof Cambridge

[Transcrição integral de artigo, da autoria de Patricia Akester,
publicado no “Diário de Notícias” de 07 Abril 2023.
Destaques e “links” meus.]

Ex-Portugal


A afirmação do Supremo Tribunal Federal brasileiro é lapidar e mais uma vez se confirma: «apenas a União pode alterar as regras da Língua Portuguesa». Referindo-se “União”, como é evidente, à designação que institucionalmente naquele país se utiliza para referir a República Federativa do Brasil. No que respeita à expressão “língua portuguesa”, na mesma frase, é igualmente evidente que se trata de apropriação abusiva da designação para fins de promoção política da língua brasileira.
 

Foi aliás nesse mesmo pressuposto, isto é, assumindo que a “difusão e expansão” daquela língua — com a patine de um idioma europeu de raiz greco-latina — seria impossível caso fosse utilizada a palavra “brasileira” em vez de “portuguesa”.

O texto em brasileiro que seguidamente se transcreve foi copiado da réplica publicada no “site” do hiper-acordista e ultra-brasileirista “Ciberdúvidas“. Daí não ser estranho o interesse dos serventuários do dito “sáitchi pôrrtugueiss” em propagandear o mais possível a situação que julgam estar já consumada e para a qual continuam a contribuir com denodo: tornar mais célere e expedito o processo de linguicídio[nota] em curso tendo por “objetivo” a “adoção” da “língua universau” brasileira em Portugal e nos PALOP.

Ao que parece — e trata-se de uma matéria que bem poderia merecer algum tratamento jornalístico, se porventura a imprensa portuguesa não estivesse quase na íntegra ao serviço dos negociantes do Centrão –, este órgão de propaganda brasileirista “especializado” já passou por dificuldades económicas, mas agora vive uma situação de desafogo, ao que não será certamente estranho o facto de «a partir de Maio de 2019, o sítio electrónico Ciberdúvidas da Língua Portuguesa passou a ser propriedade do ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa.» Daí, provavelmente, terem cessado os “ajustes directos” (ver imagem em baixo) entre o “sáitchi” e o ISCTE, os quais não chegaram, pelos vistos, para acabar com as dificuldades económicas daquele serviço “gratuito”.

Mas enfim, adiante, passemos a coisas sérias. O tal texto escrito na tal língua do tal brasileiro e etc. e tal.

O assunto é o que está na moda, a “linguagem neutra” (sem “gênero”, ou lá o que é). Convém, como de resto sucede em geral com os textos em brasileiro, que para ler semelhante estucha tenhamos sempre à mão o Dicionário de Brasileiro-Português; realmente, sem tão útil ferramenta, o número de equívocos (a multiplicar pelo grau de hermetismo deste tema em concreto) aumentaria exponencialmente.

Até porque não apenas o léxico, a semântica e a construção frásica diferem drasticamente, como também a terminologia específica da mais recente invenção politicamente correcta — castrar e esterilizar as palavras, apesar de género gramatical não ter nada a ver com sexo — presta-se a inúmeras confusões. Aliás, a ideia deve ser essa.

O que importa, no caso, é que já não basta aos acordistas e neo-imperialistas tugas substituir a Língua Portuguesa pelo “fálá” brasileiro (a língua brasileira procura ser uma transcrição fonética “simplificada”); já não basta que o #AO90 tenha sido imposto manu militari a Portugal e, como segundo objectivo, aos PALOP, com 100% de imposições brasileiras e 100% de subjugação dos tugas que negociaram a venda da nossa Língua. Não, todo esse imenso cortejo de horrores já não satisfaz os vendilhões, os novos donos disto tudo. Querem ainda mais.

Querem que Portugal continue a obedecer caninamente a todos e quaisquer ditames e ainda que os actos legais das instâncias governamentais e as determinações académicas do Brasil passem automaticamente a valer em Portugal.

Assim, no texto que o “Cibercertezas” divulgou entusiasticamente, o que eles querem mesmo é que onde se lê “escolas brasileiras” leia-se “escolas portuguesas”, que os “Projetos de Lei” da “Câmara dos Deputados” brasileira tornem obsoletos quaisquer Projectos de Lei da Assembleia da República portuguesa, que as “Diretrizes” anulem todos os programas e orientações do ex-Ministério da Educação do ex-Governo da ex-República Portuguesa.

A linguagem neutra nas escolas brasileiras – Controvérsias

Sobre a proibição do género neutro no ensino

David Nogueira Lopes

 

«(…) É impossível à democracia discutir os temas relevantes para os grupos sociais se as pessoas não têm sequer conhecimento deles. (…)»

«É vedado o uso, em qualquer contexto ou disciplina, de linguagem que empregue o gênero neutro.» Esse é o teor do Projeto de Lei 198/2023, que tramita na Câmara dos Deputados, e pretende a alteração da Lei de Diretrizes e Bases na Educação para proibir a linguagem neutra nas escolas.

A linguagem neutra, também chamada de «não binária» ou «não sexista», é aquela que não especifica o gênero das palavras para evitar a binariedade entre feminino e masculino. Seus defensores utilizam no lugar dos pronomes masculino e feminino a vogal e, como em “todes” no lugar de todos ou todas, ou a consoante x, como em “amigx” no lugar de amigo ou amiga.

É uma proposta defendida como meio de não excluir as pessoas que não se sentem enquadradas nos gêneros masculino e feminino, tendo, no Brasil, como maior expoente “iativisti” PriBertucci, “autorie” do Dossiê de Linguagem Neutra e Inclusiva, um livro que propõe a transformação da língua portuguesa para adoção da linguagem não binária. “Criadorie” da linguagem neutra no Brasil, “eli” acredita que é preciso modernizar nossa língua para refletir os comportamentos do mundo atual.

Embora pareça um tanto estranho, no tema não comporta ridicularizações. Ao contrário, exige uma reflexão profunda sobre até que ponto nossos comportamentos refletem uma postura respeitosa para quem pensa ou age diferente. Lembremos que a exclusão do diferente está na base das grandes atrocidades praticadas pela raça humana, como a Inquisição, a Escravidão e o Holocausto.

Por isso, é preciso ter muita calma na hora de tratar de temas tão sensíveis como este, da linguagem neutra. Não podemos simplesmente ignorar que há pessoas que não se sentem representadas pelos gêneros masculino e feminino e, por isso, pedem que as tratemos por um outro tipo de pronome, um que seja neutro. O fato de representarem uma parcela menor da sociedade não justifica o desprezo da maioria, porque tal argumento autorizaria também desprezar, por exemplo, a cultura dos povos originários, o que soa impensável.

A língua é sem dúvida a principal ferramenta da comunicação humana, e ninguém contesta que ela está em constante mutação. Por exemplo, o gênero neutro era adotado no Latim, a língua que deu origem ao idioma português. É bem verdade que ele era utilizado para designar objetos inanimados, como um castelo (castrum) ou o mar (pelagus). Ainda hoje o português carrega palavras que provêm do gênero neutro em Latim, como corpus e curriculum.

Com o tempo, a Língua Portuguesa passou a utilizar o gênero masculino para designar também o gênero neutro, como acontece com a palavra todos. Mas essa generalização pela utilização do masculino incomodava o movimento feminista, que não se via representado, obviamente, pelo pronome masculino, de maneira que se passou a defender uma linguagem que incluísse o gênero feminino. Por isso começamos a ver empregados nos discursos as palavras «todos e todas», ou «todas e todos». Seguiu-se, então, ao lado da chamada linguagem inclusiva, a demanda pela linguagem neutra, de onde veio o «todos, todas e todes».

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Em bom brasileiro: ‘Se diz eu mido ou eu meço?’

«A decisão do STF, neste momento, não prejudica o debate sobre o tema, só define que apenas a União pode alterar as regras da Língua Portuguesa» [jornal “Cruzeiro do Sul” (Brasil), 11 de Fevereiro de 2023] [“post” Cândido, Pangloss, Voltaire (e vice-versa)]

Depois da imposição da desortografia brasileira (#AO90), aí temos a segunda fase da anexação: o Supremo Tribunal Federal do Brasil determina que «apenas a União», ou seja, o Governo ou o Presidente da República Federativa do Brasil, «pode alterar as regras da Língua» a que, exclusivamente por motivos políticos, os profissionais do métier chamam “portuguesa”.

Portanto, por inerência, as entidades governativas que doravante passarão a administrar a e a superintender na língua brasileira “adotada” pelo Estado português serão as brasileiras: «apenas a União pode alterar as regras da língua». Entenda-se por “União”, evidentemente, a designação oficial em uso naquele país para referir os 27 estados — aos quais se junta agora o 28.º, o qual será o primeiro estado brasileiro fora da América do Sul.

Assim, Portugal não apenas “adotou” a transcrição fonética do falar brasileiro como língua nacional — impondo-a, logo à cabeça, a todos os organismos e entidades na dependência ou de alguma forma fazendo parte da administração pública — como também acatará as directivas que as entidades brasileiras vierem a ditar sobre as “regras” do dito falar brasileiro, para que sejam “harmonizadas” as “regras” fonéticas; ou seja, para que os portugueses passem também a falar e não “apenas” escrever em brasileiro.

Já revistos os programas escolares e atamancados os currículos, ao que se somou a reescrita com efeitos retroactivos de edições (incluindo as dos clássicos) e até das legendagens em material vídeo, para já não falar da importação maciça de conteúdos (de)formativos, começam agora a chegar-nos amostras de uma intensa actividade “pedagógica” vinda a nado do outro lado do Atlântico; para dar vazão aos certamente exigentes exames que por lá se fazem (a designação “ENEM”, afianço, não é uma piada), pulalam já os “especialistas” que vão pipocando entusiasticamente os seus “ensinamentos”.

É o caso, assim ao acaso, de mais este e das suas “pegadinhas” (não confundir com piadinhas). Um fulano diplomado em Matemática e em Química [sic] que dá “aulas ” lá da língua dele através da Internet e, ao que parece, com imenso sucesso, diz que “viraliza” e tudo, o que deve ser fantástico.

Bem sei que o horizonte, não sendo já azul como soía, apresenta-se agora cinzento, sinistro, quase da cor do chumbo mas ainda mais pesado. Não custa adivinhar o que prenuncia.

Dicas de conjugação fazem professor viralizar nas redes

22/03/2023 – Folhinha – www1.folha.uol.com.br

Conjugar verbos significa resumidamente ajustar aquela ação a cada uma das pessoas que a executam: eu, tu, nós, eles etc. Parece fácil, mas a língua portuguesa é cheia de pegadinhas, e algumas vezes a conjugação vira um desafio. Por exemplo: o certo é eu “eu mido” ou “eu meço”?

Nessas horas entram em campo os professores e professoras, e um deles tem feito particular sucesso nas redes com seus vídeos tirando dúvidas como essa acima. Ele é Laércio Silva de Sousa, de 36 anos, morador de Teresina (PI), e que, junto com o amigo RisonJunior, criou a página Química 2119 há dois anos — hoje o perfil do Instagram já tem quase 500 mil seguidores.

[fotografia] Professor Laércio, que viralizou nas redes com vídeos sobre língua portuguesa – Arquivo Pessoal

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