Está em curso, isso é um facto que só não vê quem não quer ver e quem está comprometido com o plano de destruição maciça da Língua Portuguesa, um processo de (horrível) contaminação linguística: as crianças portuguesas estão a ser obrigadas — quanto mais não seja, por exclusividade da oferta — a substituir a Língua Portuguesa pela brasileira, não apenas na ortografia, no léxico e na construção frásica, como também no próprio “modo de falar”. Qualquer garoto está hoje em dia mergulhado num caldo infecto cujos ingredientes são todos brasileiros; o sotaque dos nossos filhos e netos passou a ser um “sutáki”.
A começar por aquele sector que é hoje em dia o mais difundido meio de comunicação e “centro” de lazer, ou seja, a Internet. Depois de sumariamente abatida a codificação específica do Português-padrão (CHCP 860, Pt-Pt), a língua brasileira (na altura, apenas variante, CHCP 850) tornou-se a língua cibernética e computacional “univérrssáu”. Mas o arraso não foi “apenas” técnico: todas as plataformas passaram a ostentar a bandeira brasileira para significar “Português” e a demolição sistemática chegou ao extremo de terem sido substituídos conteúdos portugueses pelos “equivalentes” brasileiros.
A limpeza histórica, patrimonial, identitária, étnica e cultural foi total, radical, racista e xenófoba (agora sim, foi mesmo, por isso é legítimo chamar os bois zucas e tugas pelos nomes), como se pode ver, por exemplo, num dos casos mais flagrantes (e mais comummente utilizados) — a Wikipedia. O processo aniquilou do mesmo passo tudo o mais, a Google (ou qualquer outro motor de busca), a YouTube, as redes (anti-)sociais (Facebook, Twitter, Instagram etc.), os sites com serviços de tradução (!) (automática ou não) e, enfim, tudo, absolutamente tudo o que é de uso mais comum, quotidiano, utilitário e até… pedagógico.
É nesta horrorosa conformidade que surge a polémica — que de polémico nada tem, tão evidente ela é — sobre o que andam facínoras a enfiar goela abaixo às crianças portuguesas. Depois de o “DN” ter lançado o alerta inicial, chamando a atenção para a contaminação forçada pela ingestão de detritos, e também depois de no Brasil alguns maduros terem acusado o toque e respondido com as tretas habituais, o próprio Luccas (olha, que pinta, uma “consoante muda”) bota faladura no JN para anunciar a extraordinária benesse de passar a dobrar as suas performances numa data de línguas, incluindo… “o Português de Portugal”!!!
Ena, mas que luxo. Obrigadinho, ó ganda bacano, como dirão certamente os “tuguinhas” vidrados no cromo. Como extra, lá vem a rapsódia habitual do indefectível “amor a Portugal” (não deve haver um único dos 210 milhões de brasileiros que sobre Portugal não diga que tem um avô em Alguidares de Baixo ou uma tiazinha na Porcalhota) e a surpresa, essa sim, deve ter doído aos neo-imperialistas, um valente pontapé, super-merecido, em cheio nas miudezas de malaquenhos, becharenses e quejandos especímenes: não há “língua universáu” para ninguém, o homem diz que vai dobrar (“dublar”, em brasileiro) as suas charlas para o Português-padrão.
Tal declaração de intenções (veremos, veremos) contém uma série de implicações políticas óbvias — uma figura popular brasileira reconhece que o Português e o brasileiro são Línguas diferentes — e vem recentrar a questão nos moldes devidos: os brasileiros têm tanto direito à sua própria Língua nacional como os portugueses a conservar intacta a sua Língua-padrão, velha de 800 anos. “Acordo” algum jamais martelará, envenenará ou perverterá a realidade, por mais que a alguns loucos, de ambos os lados do Atlântico, apeteça o camartelo, a proveta, o experimentalismo com que pretendiam envenenar a Língua Portuguesa.
A alguns brasileiros, pelo menos, e nada nos impede de supor que serão estes uma maioria esmagadora, nada os move contra Portugal e os portugueses, a sua cultura e aquilo que de todo a define. Portanto, eles ficam lá com a sua língua e nós por cá com a nossa. Cada um c’a sua, como diz o povo.
É nesta convicção — esperemos que não venha a ser “misteriosamente” defraudada, como é de regra nos escuros meandros da política — que poderemos então iniciar os trabalhos de reconstrução da Língua Portuguesa, entretanto gravemente agredida pelo AO90 e ferida pela demolição indiscriminada da cultura portuguesa a pretexto de uma aberração a que chamaram “língua unificada”.
Luccas Neto vai dobrar episódios para português de Portugal
Youtuber brasileiro que faz sucesso junto do público infantil antecipou ao JN que, em 2022, os conteúdos dos episódios no YouTube serão dobrados para vários idiomas, inclusive para português de Portugal.
Depois de uma reportagem publicada pelo “Diário de Notícias”, na quarta-feira, ter chamado a atenção do público por afirmar que há crianças portuguesas que “só falam brasileiro”, muito em parte devido ao sucesso do youtuber Luccas Neto em terras lusas, o artista antecipou agora ao JN aquilo que diz ser uma novidade que só estava prevista ser anunciada no próximo ano.
“Devido à grande repercussão das matérias sobre a influência do conteúdo na linguagem das crianças portuguesas e ao enorme carinho que tenho pelos fãs do país (…), para o ano que vem, a empresa [Lucas Toon] vai dobrar todos os nossos episódios no YouTube, além dos filmes e séries”, revelou ao JN Luccas Neto.
“Queremos dobrar nos idiomas inglês, espanhol, hindi e português de Portugal. Esse tipo de investimento em dobragem na língua portuguesa nunca foi feito por nenhuma empresa brasileira focada no público infantil. Portanto, eu serei o primeiro”, acrescentou o youtuber brasileiro, que só naquela plataforma de vídeo conta com mais de 36 milhões de inscritos.
Ao JN, o também actor e cantor de 29 anos, que ainda não tinha comentado o assunto, desvalorizou qualquer polémica sobre a influência do seu conteúdo na linguagem das crianças portuguesas e sublinhou o “amor gigantesco por Portugal”.
“A minha família é portuguesa, fui criado pela minha avó e também sou cidadão português. Após a minha temporada em Lisboa, posso afirmar que o meu amor pelo país só aumentou”, finalizou.
Recorde-se que o artista esteve no último fim de semana na capital portuguesa com o espectáculo musical “Luccas Neto e Escola de Aventureiros”, em três sessões esgotadas. Estão ainda previstos quatro espectáculos no Pavilhão Multi-usos de Guimarães na próxima semana (de 19 a 21, com dose dupla a 20).
“Principal desencaminhador linguístico de tuguinhas“
A reportagem do “Diário de Notícias” sobre a influência do youtuber nas crianças portuguesas gerou grande controvérsia entre o público brasileiro. Em causa estaria o facto de, “à conta de muitas horas de exposição a conteúdos feitos por youtubers brasileiros”, as crianças terem apreendido palavras em português do Brasil. “Dizem grama em vez de relva, autocarro é ônibus, rebuçado é bala, riscas são listras e leite está na geladeira em vez de no frigorífico”, escreveu a autora da peça jornalística.Em reacção, e num artigo publicado na “Folha de São Paulo”, o jornalista Sérgio Rodrigues refere que “não é justo acusar a reportagem do DN de xenofobia, embora ela exale um nacionalismo rançoso.” O autor refere ainda que a peça em questão cita Luccas Neto como o “principal desencaminhador linguístico de tuguinhas”. Já o “Estado de S. Paulo” destaca que o sotaque tem criado “polémica entre os pais e virou tema da imprensa local”, depois do aumento do intercâmbio cultural entre os dois países.
[Transcrição integral de artigo publicado no “JN” de 12 Novembro 2021. Corrigi a cacografia brasileira do original. Destaques, “links” (a verde) e sublinhados meus.]