Quem te avisa teu amigo é [por Graça Maciel Costa]

olivetti82«Tem um original e gostaria de o ver publicado?» Este é, mais coisa, menos coisa, o isco com o qual se esfregam egos e se captam “novos talentos”. É de louvar, ninguém o nega, que se busquem novos autores, talvez seja uma forma como outra qualquer de descobrir o próximo Nobel da Literatura, quem sabe?

E se é de sonhos que falo, é natural que alguns resultem em pesadelos. Editar um livro, principalmente para os inexperientes e ingénuos escritores, pode revelar-se um saco de problemas complexos.

Primeiro, há que destrinçar os “impressores de livros” e os editores, depois há que ter em conta e analisar muito bem o contrato que nos fazem chegar. Os “impressores de livros” limitam-se a publicar tudo o que lhes vai parar às mãos, com ou sem qualidade literária, fazendo pagar à cabeça uma certa quantia por 30% dos exemplares da primeira edição — se houver uma segunda é sinal de que a coisa não correu mal de todo. Se se vendem depois ou não, é problema de quem investiu — o escritor iniciante, claro, que tem de dar ao dedo se quiser recuperar alguma coisa do que entregou na assinatura do contrato. Isto porque o volume de originais editados, ou de ingénuos captados, é o suficiente para os “impressores de livros” ganharem a sua vidinha.

Agora, analisemos o contrato. Antes de assinar, convém saber o que nos diz o Código do Direito de Autor e Direitos Conexos (CDADC) — é um documento público, pelo que uma simples pesquisa pelo nome, na Internet, é suficiente. Antes do mais, deverá constar a cláusula «ne varietur» (art.º 58.º ), que impede que a obra seja reproduzida pelos seus sucessores ou por terceiros em versões não autorizadas pelo autor. Esta cláusula é de supremo interesse para todos aqueles que não se deixaram sucumbir pelas falácias do nefasto AO90, pois poderão ver a sua obra “acordizada” sem que lhe digam água-vai. Caso esta cláusula não conste do contrato e o autor já o assinou, deve, durante a revisão, declarar por escrito que não autoriza o AO90 seja aplicado ao original, sobre o qual possui plenos direitos de autor. O ideal seria incluir essa cláusula no contrato especificando que a ortografia está e terá de manter-se segundo o AO45 e exigir provas prévias com declaração final de conformidade do autor e de representante legal da editora; mas, se já assinou o contrato, não se esqueça de o mencionar por escrito quando der por terminada a revisão da obra, repito. Isto porque o art.º 93.º do CDADC diz: «Salvo por opção ortográfica de carácter estético do autor, não se considera modificação a actualização ortográfica do texto em harmonia com as regras oficiais vigentes» — e chamo a atenção para a parte sublinhada.

Outro ponto importante, o art.º 59.º do CDADC, que previne que haja modificações à obra sem o consentimento expresso do autor.

Agora passemos à quebra de contrato por parte do editor. Sim, acontece algumas vezes, seja porque alguém (finalmente e de facto) leu a obra e não gostou, ou por qualquer outro motivo desconhecido — queria referir aqui a razão política mas isso ficará, talvez, para outra crónica.

O CDADC é intransigente na defesa do autor e isso manifesta-se logo no art.º 56.º, alíneas 1 e 2, sobre os direitos morais do autor, mais exactamente, «a honra e reputação do autor», afirmando que «Este direito é inalienável, irrenunciável e imprescritível […]». Posto isto e porque no contrato deverá constar o prazo máximo para edição da obra, a quebra do mesmo atenta não só contra os direitos morais, como também contra os direitos patrimoniais — não havendo publicação, não há retorno do que o escritor pagou à cabeça. O art.º 90.º, alínea 1, do CDADC, que versa sobre as obrigações do editor, afirma, preto no branco, que o editor deve «em caso de incumprimento, indemnização ao autor por perdas e danos». É certo que as editoras e impressores de livros contam com a morosidade e com os custos exorbitantes do processo judicial e um autor não consagrado não tem nem dinheiro nem tempo para esperar, mas não podemos ficar parados à espera de que tenham um rebate de consciência.

Um dos sites que poderá começar por visitar é o da Inventa Internacional; o Provedor de Justiça é outra das portas à qual bater; e ainda, é claro, deverá ao menos ver no “site” da Sociedade Portuguesa de Autores o que há sobre este assunto.

Por fim, não esqueça que nenhuma organização gosta de má publicidade. Se a sua editora ou impressora de livros deixou de lhe dar cavaco e quebrou o contrato, avance com tudo o que tiver, até a publicidade negativa.

É provável que haja editores honestos e sérios, pelo menos assim quero crer, mas a minha experiência pessoal diz-me que há furões por aí. Mas esse poderá ser, como já disse, assunto para outra crónica.

Graça Maciel Costa


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